sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

CELEBRIDADE NO DIVÃ: RONALDO FENÔMENO

A surpresa da semana passada foi anunciada com uma antecedência precisa. Mal se  ventilou que  Ronaldo deixaria os gramados e teria convocado uma entrevista coletiva para formalizar a notícia, anteciparam-se e seguiram-se uma goleada de homenagens, videos com suas melhores jogadas, depoimentos lamentosos e um onipresente arsenal publicitário.


Ronaldo Nazário que incorporara ao nome por  inspiração de algum marketeiro de plantão a alcunha de Fenômeno, depois de ser emancipado do diminutivo Ronaldinho, viu-se  já bem precocemente como atualmente é cada vez mais comum, cercado, embrulhado e rotulado para ser ofertado ao público na condição do produto bilionário que se tornaria. Sua despedida, portanto, parecia ser para muitos dos que o rodeavam a derradeira oportunidade de fazer dele a última bolacha do pacote de ganhos fenomenais.


Se a pessoa do futebolista teve a oportunidade de expressar-se e ser realmente ouvida fica daí uma ponta de dúvida. Sua decisão tenta colocar fim num processo longo e penoso que lhe deu glórias, fama e dinheiro, mas também  lhe custou a privacidade,  a saúde do joelho e boa parte de sua autonomia, justamente aquelas coisas com as quais muitos de nós sonhamos alcançar quando não temos  glórias, fama e dinheiro. Mas definitivamente recuso-me a entabular um discurso que pretende se desfazer do ônus próprio de cada escolha. Mesmo porque Ronaldinho (permitam-me!) não é um bom exemplo de “vítima do sistema”. E já deu demonstrações suficientemente claras e inteligentes de que não compra (nem vende) essa imagem. Mesmo porque, o que convém calar é justamente o preço a se pagar por ter tanto.


Desejo focar, no entanto, dessa figura pública apenas o sujeito que se deixou escapar do controle daquilo que cuidadosamente se tentou revelar e esconder para torna-lo modelo de identificação para as massas de torcedores-consumidores. Trata-se de 3 aspectos:


1. a relação com sua mãe, dona Sonia;


2. suas parcerias afetivo-sexuais;


3. e sua relação com o próprio corpo.


Parece-me relevante trazer a tona a figura de sua mãe, pois ela talvez seja o protótipo desse cerco protetivo a que o jogador foi levado a se submeter.   Nos momentos de crise era ela a primeira a aparecer para fornecer a versão oficial dos fatos, trazer as notícias apaziguadoras e servir de refúgio consolador ao filho desamparado.  Como toda mãe, diga-se de passagem, porém com um papel elevado a potência de um fiel da balança de decisões que determina escolhas  que caberiam apenas a um adulto responsável por sua própria felicidade.É sintomático que Ronaldinho tenha tomado sua decisão quando a família estava de férias.


Contestando ou confirmando a vontade da mãe docemente dominadora parece explicar as opções por tão desiguais parceiras:  a primeira mulher, Milena, tão perfeita no papel de nora ideal quanto sexualmente desinteressante como convém. Da potranca indomável Daniela Cicarelli, escolha flagrantemente feita para dar errado, mesmo encarcerada num castelo luxuoso e cercada de Ferraris ofertadas de presente. Até a aventura com os travestis que resultou no escândalo de dimensões inesperadas.


Se a aventura foi meramente fortuita ou recorrente não se sabe e talvez nem seja relevante, contudo parece marcar um outro ato que é o do sujeito que busca encontrar-se onde não se pode reconhecer, onde apenas ele no uso solitário de sua liberdade e suas conquistas (seu dinheiro e sua fama) pode se fazer afirmativo; onde ele parece precisar perder-se para se reencontrar. Vale perguntar também se haveria  lugar no universo machista do futebol para as dúvidas de natureza sexual?


Com este gesto, Ronaldinho parece tentar desvencilha-se do laço apertado da imagem social de bom moço e filhinho da mamãe. Contudo, o que ninguém suspeitaria é que seus negócios sobreviveriam ao escândalo e, via de regra, seria mercantilizado,  enlaçando-o numa inusitada identificação com os torcedores que  prezam tanto a virilidade, mas se sentem plenamente justificados em trocar abraços e carícias entre si quando o time faz um gol. Mais uma vez mal sucedido, foi o seu mais contundente ensaio de ruptura.


Por fim, é no corpo que Ronaldinho apela para dar expressão aos conflitos que lhe tomam. O corpo que  no início foi artificialmente moldado para se transmudar no guerreiro musculoso para a batalha campal na arena dos estádios de futebol, no final de carreira se reapresenta novamente inflado desta vez  para a encenação de sua decadência pública. Não bastaram os esforços de especialistas em saúde e boa forma, todo  rigoroso esquema de ginásticas, dietas, remédios emagrecedores e operações lipoaspiradoras. Portanto, leitoras crédulas nos milagres da medicina, desistam. Se não deu certo para ele, também não dará para mais ninguém. É preciso mais que tecnologia para diminuir a gordura que está do lado de dentro de cada cabeça.  Ainda mais quando seja edulcorada com um diagnóstico pensado para salvarguadar de culpas adiposas nossas consciências igualmente pesadas. Não foi o hipotireoidismo disseram os especialistas que impedia Ronaldo Nazário de se livrar da espessa capa protetora formada por camadas de gordura.


Eu, daqui, do meu descompromissado blog, assumo a análise selvagem: Ronaldinho precisava de algo que o isolasse de tudo que não fosse ele mesmo. Conseguirá?

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O RISCO DE UMA HISTÓRIA UNICA



As nossas vidas, as nossas culturas, são compostas por muitas histórias sobrepostas. A romancista Chimamanda Adichie conta a história de como descobriu a sua voz cultural,  e adverte que se ouvirmos apenas uma história sobre outra pessoa ou país, nos arriscamos a um desentendimento crítico.





Fonte: <a href="http://www.ted.com/talks/lang/por_pt/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_story.html">http://www.ted.com/talks/lang/por_pt/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_story.html