sexta-feira, 25 de março de 2011

O QUE OBAMA NÃO DISSE SOBRE O BRASIL

Obama-visita-brasil-Rio-de-Janeiro-21-03-2011
em Veja.abril.com.br

O Brasil viu de perto a força da oratória e a simpatia cativante do homem que em pouco tempo na vida pública chegou a presidência da nação mais poderosa do mundo. Apesar de ser negro e possuir um nome que o mínimo que se pode dizer  é que é, digamos, um tanto quanto diferente.
As  barreiras que Barack Hussein Obama teve de superar são ainda mais assombrosas quando olhadas retrospectivamente, ainda que se saiba que, certamente, teriam sido intransponíveis não fosse o desastroso legado deixado por seu antecessor.
O discurso de Obama teve uma clara intenção bajulatória num momento em que  os EUA passam por uma crise bastante grave e necessita de parcerias a altura de suas pretensões de recuperação.  Nada disso porém apagou o brilho de uma performance nada menos que arrasadora. Recorrendo a expedientes que na boca de outros pareceriam apelativos, como a referência ao futebol, às belezas da cidade maravilhosa e, sobretudo, os elogios ao passado da atual e do ex-presidente brasileiros.
Talvez tenhamos aí uma boa definição desse entidade exotérica e controvertida que algumas pessoas insistem em adesivar nos tipos mais diferentes e contraditórios e chamar de carisma.  Eu diria que carisma é a capacidade de fazer com charme e naturalidade o que em outras pessoas soaria excessivo ou mesmo ridículo.
Pessoalmente, o que me chamou atenção é o que foi deliberadamente omitido. Por desnecessário que se tornou ou por incômodo que pudesse ser para este blogueiro não importa. Ao visitar o país com a maior população de origem africana fora do continente negro, nenhum comentário, nenhuma menção sequer de sua parte a esta população. Nem entusiasmada, nem lamentosa.  Nenhuma palavra reflexiva sobre avanços ou retrocessos na caminhada que os negros vêm trilhando pela história desse país. Para Obama e a seleta platéia para a qual se dirigiu, no Brasil a questão racial não é um problema. Vale lembrar que sua audiência no portentoso Teatro Municipal do Rio de Janeiro teve a população negra subrepresentada, a exemplo do que ocorre nas situações em que se reúne a elite predominantemente branca deste nosso país.
Óbvio que o presidente americano não veio ao Brasil para causar desconfortos diplomáticos. Sua missão não era a de um militante, mas a de um comerciante, porém como negar a imensa expectativa que o primeiro presidente negro causou entre os negros brasileiros?
Contudo, Obama, com sua presença de homem negro, ao lado de sua família também negra, parece transcender aos discursos. Não há como não perceber um certo travo de estranheza, de uma novidade que surpreende e fascina. Mesmo os olhares mais adestrados, os que estão acostumados na arte do adesismo ao poder, seja lá quem o ocupe. Mesmo entre os que se orgulham em rezar pelas cartilhas da nova hipocrisia institucionalizada, chamada de politicamente correta. Obama e sua família é um acontecimento fora do esquema, ainda que cercado dos mais rígidos protocolos. É um sinal de desajuste naquilo que anteriormente parecia tão harmonioso e justo.
Parecer dizer mais do que de fato diz é também um traço  próprio daqueles que ocupam o posto especial a que se atribui qualidades capazes de representar o ideal coletivo. No nosso caso, como brasileiros, tivemos a oportunidade de experimentar o céu e o inferno de ter mandatários com esse poder de persuadir sem saber realmente do que estamos sendo convencidos.  A opinião pública americana, embora o tenha eleito, parece a esta altura do seu contexto político não ter optado claramente se Obama é confiável ou não.  De minha parte, devo dizer que mesmo reconhecendo que no mundo da política quase nada pode ser explícito, deixo claro que gostei muito mais do que não foi dito.

sexta-feira, 18 de março de 2011

LINGUA PRESA E LINGUA SOLTA - LULA, VICENTINHO E O REI


Minha mãe, que acha que tem a lingua presa e fala destacando pedagogicamente os esses, nos raros momentos em que os encontra, quer saber como Lula conseguiu ¨consertar a língua¨. A impressão que tem minha mãe não é desprovida de sentido. Também um contingente enorme de pessoas passou a entender o que antes parecia um defeito incorrigível para um Presidente da República um detalhe que se tornou irrelevante. Não foi porém o Lula quem ¨consertou a língua¨. Nós é que nos acostumamos com seu modo de falar.
Nada de mais se não fosse o poder um jogo de trava-línguas e enrola o pensamento. Lula para expressar o que pensava sempre desdenhou o  freiozinho natural localizado embaixo da língua. Desafiou o regime militar e cativou multidões, com um discurso ousado para uma época marcada por prisões e torturas.
Consagrou-se líder, chegou a Presidente da República. No cargo, descabelou seus assessores de imprensa com improvisos desconcertantes, e mudou o estilo sisudo da liturgia do cargo. Para seus críticos, cometeu excessos, falou demais quando poderia calar-se e tarmudeou quando deveria ser mais incisivo.  Com tudo isto, Lula jamais perdeu a oportunidade de discursar, mesmo quando era para anunciar que deveria ficar calado, como ocorreu durante a posse de Dilma. Ainda que fosse para atropelar as mais elementares normas gramaticais, fazendo o desgosto daqueles que fazem da concordância uma religião de discórdia e cultivam mais as línguas mortas que a palavra viva.
O que faz de Lula um orador com um talento natural não se explica por uma capacidade de juntar os esses na hora certa ou por uma dicção primorosa. Tampouco por sua capacidade de se fazer entender, uma vez que os discursos politicos cada vez mais se assemelham a arte do ilusionismo.
Neste contexto, torna-se ainda mais contrastante diante de nossa realidade o dilema do soberano inglês retratado no filme ganhador do oscar ¨O Discurso do Rei¨. Nele,  Geoge VI enfrenta um dilema por tentar corresponder ao padrão de qualidade dos oradores que o antecederam. Aqui, Lula parecia justamente tentar destituir seus antecessores a partir de um modelo rebaixado, mas condizente com as deficiências do povo pobre com o qual deseja se identificar.
Muito já se debateu sobre a frequente exaltação que o ex-presidente fazia de sua condição de homem pouco escolarizado. Lula certamente também viveu o dilema entre se descaracterizar, perdendo a identificação com o eleitor comum e aceitar as modificações que o permitiriam ser melhor aceito nos círculos da classe média e alta. 
As mudanças em sua aparência na eleição em que saiu vencedor, no entanto, não deixam dúvidas. Do metalúrgico de barba desleixada e maltrapilho, travestiu-se com os signos daquilo que corresponde a um profissional bem sucedido e próspero, com ternos bem cortados e dentição realinhada. Também poderia ter se empenhado em aulas de português e dicção e se submetido a intervenções cirúrgicas que poriam fim a seu sibilar característico, já que, ao falar, reemergia o antigo sindicalista de macacão e coturno surrados? Talvez, porém, o que seria dos humoristas que se tornaram sócios de sua promoção? Como fetichizar a pobreza?  E como estimular a culpa social da classe média pelos menos favorecidos?  Como fazer das razões que envergonham os pobres motivo de triunfo?
 Vicentinho, outro ex-sindicalista, também com sua ¨lingua presa¨ enveredou por caminhos inusitados: foi estudar, tornou-se advogado. Elegeu-se deputado, mas parece ter perdido o charme, a aura de autenticidade.
Tenho uma teoria: a grande sacada dos assessores de imagem de Lula, ainda que involuntária, foi justamente valorizar a mistura das desconjuntadas figuras numa alegoria única. Deste modo, satisfaz a ambas as parcelas do eleitorado.
Mistura no Brasil quase sempre dá certo!

PS: Dizem os especialistas, que ao contrário da crença popular, Lula não tem a lingua presa, mas sim solta. Segundo a fonoaudiólga e professora Léslie Piccolotto Ferreira ¨os leigos acreditam que o fenômeno se dê por estar a língua presa, mas na verdade o que acontece é o inverso: a língua está solta. Escapa por inúmeras alterações explicadas por aspectos hereditários ou adquiridos, como ser maior do que a estrutura óssea e/ou dentária (muitas vezes o indivíduo nasce com as características ósseas da mãe, no caso pequenas, e de língua do pai, no caso volumosa...) ou por não estar a musculatura tão firme quanto deveria ser (alimentação inadequada para a idade ou hábito como chupar o dedo).¨ Ver: http://www.terra.com.br/istoegente/183/saude/index.htm



sexta-feira, 11 de março de 2011

A Encarnação da Musa Carnavalesca em Adriane Galisteu


Em geral, não sou dado a festividades, mas acabo me rendendo aos apelos visuais e eroticos que os festejos de momo franqueiam a todos, querendo ou não. Alguns conhecidos e mesmo amigos supõem que por ser negro e brasileiro devo de estar de prontidão para a folia imediata  ao simples soar de qualquer tambor, por mais mal tocado que seja. O carnaval é fenômeno essencialmente primitivo e evoca os movimentos de massas e há quem ache graça em se perder no meio de multidões enloquecidas a celebrar não importa o que.
Sambar algumas vezes me parece  um pula-pula desesperado de quem está com os pés numa frigideira quente e fez desse martírio uma arte satírica.  Desconheço estudos neste sentido, mas  há quem diga que o break nasceu da observação dos passos descompassados dos neuróticos da Guerra do Vietnam, que sofreram lesões neurológicas. Daí talvez a despropositada comparação.
 Nada disso entretanto importa. O que me fascina mesmo são as musas do carnaval. Elas são capazes de transformar qualquer crise epilética num movimento harmonioso e sensual. Seja lá que funções diferenciadas elas tenham, sejam rainhas de bateria, porta-bandeiras ou simplesmente musas, elas encarnam o que há de mais feminino e misterioso naquilo que é capaz de produzir hipnose coletiva. Mais do que isto, fazem justificar a marcha rumorosa da escola de samba para um destino imponderável, em direção a qualquer triunfo imaginário.
Impressionante este ano como mesmo as escolas fustigadas pelas chamas que incendiaram seus barracões passaram pela avenida (o sambódromo) como se cumprissem  uma missão divina. E pode-se dizer que algumas delas superaram suas adversárias que não tiveram o mesmo infortúnio. Nada confirmou as previsões pessimistas ( ou realistas) que poderiam atribuir às tragédias da região serrana um sobrepeso depressivo ( ou solidário) aos desfiles do carnaval carioca. Nada disso. O carnaval é um intervalo sem nexo com a história, que rompe a linearidade da vida comum. Algo que escande no tempo e no espaço finitos da existência previsível.

Por isso as musas se revelam  num papel tão relevante. São a eternização da juventude e do desejo.
Muito se discutiu sobre a razão pela qual se dá tanto destaque  àquelas que sequer fazem parte da chamada comunidade. Seriam oportunistas, no dizer de seus críticos, que  somente aparecem nas horas de folia. Nunca estão presentes no quotidiano que nivela a todos ao patamar do que é comum (daí o substantivo com pretensões de adjetivo: ¨comunidade¨).  Embora haja pessoas da comunidade que são alçadas a dimensão imaginária de uma condição de superioridade, parece-me que é justamente pelo caráter de algo inalcançável, do que se coloca distante e fugaz  que é possível consagrar-se uma musa.
Corpo malhado no ócio e não no trabalho, esguia e sinuosa  nos detalhes fatais em meio às gordurinhas alheias e branquela entre a turba crioula, Adriane Galisteu é um exemplo radiante do ideal encarnado na mulher.  Aquela que foi capaz de capturar o desejo de um grande outro vencedor, Airton Senna. Adriane uniu numa expressão sofisticada dois esportes nacionais: o dos motores potentes e fetichizados com o alpinismo social dos menos abastados, e fez de si uma marca daquela que alcançou por seus próprios atributos a ascensão e a evidência que
adormecem no íntimo de cada brasileiro e brasileira.
Pela pessoa de  Adriane Galisteu particularmente não nutro grandes simpatias, mas reverencio  sua competência em encarnar esse objeto a que move nossas ambições e nos faz delirar. Ainda que tudo se acabe numa quarta-feira de cinzas.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Os sete sapatos sujos da modernidade

 Autora: Dad Squarisi

Conhece Mia Couto? Moçambicano, ele estudou medicina e biologia. Mas se dedica às letras. Tem leitores cativos em Europa, França e Bahia. Os brasileiros o prestigiam em lançamentos, palestras e tietagens. Os patriotas também. Outro dia, convidaram-no para abrir o ano letivo do Instituto Superior de Ciências de Moçambique. O tema: os sapatos sujos da modernidade.

Ele justificou a escolha do assunto assim: "Não podemos entrar na modernidade com o atual fardo de preconceitos. À porta da modernidade, precisamos nos descalçar. Contei sete sapatos sujos que necessitamos deixar na soleira da porta dos tempos modernos. Haverá muitos. Mas eu tinha de escolher. E sete é número mágico".

O 1º sapato sujo: a ideia de que os culpados são os outros e nós somos sempre vítimas.

O 2º: a ideia de que o sucesso não nasce do trabalho.

O 3º: o preconceito de que quem critica é inimigo.

O 4º: a ideia de que mudar as palavras muda a realidade.

O 5º: a vergonha de ser pobre e o culto das aparências.

O 6º: a passividade perante a injustiça.

O 7º: a ideia de que, para sermos modernos, temos de imitar os outros.


Fonte: http://www.dzai.com.br/blogdadad/blog/blogdaddad

domingo, 6 de março de 2011

PARA ONDE? PARA QUE?


No dia 17 de fevereiro de 2008  o motorista de uma Parati percorreu 4 km pela contramão em uma das estradas mais movimentadas de São Paulo, bateu contra um caminhão e morreu numa manhã ensolarada de domingo.

Em 08 de março do ano passado um carro andou 13 km na contramão na região de Cotia, na Grande São Paulo, bateu em outro e deixou duas pessoas mortas na madrugada de uma banal segunda-feira.

No dia primeiro de março  deste ano o policial militar Roberto Santos foi ferido após dirigir  por 5 km a cerca de 100 km/h na contramão de uma das principais avenidas de S.Paulo, a Bandeirantes.  No trajeto, colidiu com 9 veículos e só então parou.

Numa 6a.feira do dia 28 de janeiro, os pacatos habitantes do município de Livramento de Nossa Senhora, no sudoeste baiano, surpreenderam-se com o veículo oficial da Prefeitura, que é utilizado pelo gestor, Carlos Souto (PMDB) estacionado na contramão de uma das principais vias da cidade.

No ultimo dia 25 de fevereiro o funcionário do Banco Central Ricardo Neis atropelou vários ciclistas numa via pública na cidade de Porto Alegre porque o impediam de seguir seu caminho devido a uma manifestação cujo lema foi resumido no dia seguinte na frase pintada no asfalto como manifestação de  protesto: `mais amor, menos motor´.

Os exemplos são inúmeros e as estatísticas não mentem, o trânsito no  Brasil, parado nos congestionamentos cada vez mais frequentes ou em seu movimento veloz tornou-se uma calamidade pública. Em 2010 os acidentes aumentaram 13% em relação a 2009. Este ano, neste período do carnaval, as expectativas não são mais otimistas.

Nos episódios que os motoristas tem protagonizado um elemento parece recorrente. Quase sempre demonstram uma urgência que os impele em direção a algum objetivo obscuro. Mais do que a velocidade proporcionada pelos motores potentes, algo parece justificar e exigir uma pressa em atender a um tempo wue avança inclemente. Porém, trata-se de uma pressa sem norte e um fim no horizonte, tanto é que recorrem a caminhos sem bússola e de sentidos transversos. Caberia perguntar para onde vão os motoristas que correm tresloucados pelas ruas e estradas?

Ainda que a cada um seu tempo e itinerário, mas para onde? Para que?

Desse sintoma contemporâneo, fica a expressão também vazia de sentido e explicações que se repete no noticiário das mortes no trânsito: ´o motorista perdeu o controle da direção...´´

ANIMAÇÃO NA AREIA


Este video conta por meio de desenhos rápidos feitos numa tela de areia imagens da invasão da Alemanha na Ucrânia durante a Segunda Guerra Mundial. Enviado pelo meu amigo Verly. Um fantástico vídeo da artista ucraniana Kseniya Simonova.
Fonte: http://pelapapas.com.mx/htmls/animacion-arena-2.html